Demora no Judiciário perpetua sofrimento de famílias vítimas de chacinas

Famílias das vítimas da chacina de Osasco, Itapevi e Barueri vivem impacto da demora no Judiciário, um agravo no sofrimento e empobrecimento.
Demora no Judiciário perpetua sofrimento de famílias vítimas de chacinas
Foto: Canva

O assassinato de um ente querido é uma dor insuportável. No entanto, para as famílias das vítimas de chacinas, o sofrimento vai além do luto, sendo marcado por uma batalha prolongada no sistema judiciário. Este processo não só dilacera emocionalmente, mas também empobrece e adoece os familiares, que enfrentam a lentidão judicial nos processos de indenização, responsabilização e criminalização. O caso da Chacina de Osasco, Itapevi e Barueri, que completou dez anos nesta quarta-feira (13), é um exemplo claro dessa realidade.

O episódio, que resultou na morte de 19 pessoas, ainda deixa muitas dessas famílias sem o devido ressarcimento, como é o caso de Zilda Maria de Jesus, mãe de Fernando Luiz de Paula, assassinado em um bar de Barueri. Zilda, além de não ter recebido qualquer tipo de indenização, enfrentou acusações infundadas dos advogados dos réus durante o julgamento. Ela descreve seu sofrimento: “A gente não tem nem direito de guardar o luto. Eu já estou morta, filha”, afirma, refletindo o desgaste de tanto tempo em busca de justiça.

Impactos graves nas famílias das vítimas

A violência que essas famílias enfrentam vai muito além da perda. Como explica a professora e especialista em direitos humanos, Carla Osmo, “essas vítimas deixaram mães, pais, filhos e companheiros, que sofreram impactos severos, incluindo empobrecimento e adoecimento. Além do sofrimento emocional, as famílias passam a viver em um estado de vulnerabilidade, enfrentando não apenas a perda, mas também o abandono do Estado. “Há casos de adoecimentos graves relacionados a esse sofrimento”, complementa.

O tempo, que deveria trazer algum alívio, apenas prolonga o sofrimento, pois a demora nos processos judiciais agrava ainda mais a situação. Carla Osmo aponta que a lentidão gera frustração e exaustão nas famílias. “O processo é violento, desgastante. A falta de resposta do Judiciário transmite a sensação de desvalorização do sofrimento dessas famílias”, diz.

Estigmatização e o medo da polícia

Outro fator que complica a vida dessas famílias é o estigma imposto pela sociedade. O fato de terem um membro da família morto por policiais militares gera medo, insegurança e a sensação de que a vida dessa pessoa não tem valor. As vítimas de chacinas são, muitas vezes, desvalorizadas pelo próprio Estado, que não parece dar importância ao ocorrido. “Essas famílias se sentem à margem”, explica Osmo.

A busca por responsabilização do Estado

Em busca de justiça, muitas famílias recorrem à Justiça para responsabilizar o Estado pelos crimes cometidos. Como observa Carla Osmo, “não são apenas os agentes individuais que têm responsabilidade, mas o Estado, como instituição, também deve ser responsabilizado”. A luta das famílias é pela responsabilização institucional e pelo reconhecimento de que essas chacinas fazem parte de uma história de violência de Estado, especialmente em São Paulo.

Atualmente, há 16 processos em andamento relacionados à chacina, sendo que cinco deles tramitam em segredo de justiça. Dos casos que não estão sob sigilo, apenas dois chegaram à fase de execução, mas sem que as indenizações tenham sido pagas até o momento. “Esses processos têm uma média de seis a sete anos de duração, sem conclusão”, revela Carla.

A demora no Judiciário e seus efeitos

A morosidade judicial, como aponta Carla Osmo, está descompassada com a gravidade dos danos. “Essa demora é ainda mais cruel, considerando que muitas das mães das vítimas, além de idosas, perderam filhos pequenos ou crianças”, explica a professora. O Estado, além de demorar a responder, contesta as decisões, exigindo provas excessivas e tentando minimizar o sofrimento das famílias. “A defesa do Estado frequentemente questiona os direitos das famílias, levantando suspeitas infundadas sobre as vítimas e argumentando por valores baixos de indenização”, acrescenta.

Dez anos de espera e a continuidade da dor

Dez anos após a chacina, o sofrimento das famílias continua. “O tempo não apazigua”, afirma Carla Osmo. Para as mães das vítimas, a sensação é de que a violência ainda persiste, pois a falta de resposta do Estado apenas intensifica a dor. “Elas dizem que o sofrimento da perda é como se tivesse acontecido agora”, completa.

Apesar de toda a dor, a coordenadora do projeto Clínica de Direitos Humanos da Unifesp, que atua em apoio às famílias, enfatiza a importância de não deixar o caso cair no esquecimento. “O apagamento da violência de Estado está diretamente relacionado à sua continuidade. Precisamos lembrar para evitar que outras violências como essa se repitam”, conclui.

Resposta da Secretaria de Segurança Pública

Em nota enviada à Agência Brasil, a Secretaria de Segurança Pública de São Paulo informou que o inquérito policial sobre o caso foi concluído em 2013, com a identificação e indiciamento de oito pessoas, incluindo sete policiais militares e um guarda civil metropolitano. Todos os PMs envolvidos foram expulsos da corporação. No entanto, a secretaria não forneceu mais detalhes sobre as indenizações, e o governo paulista não retornou aos contatos da reportagem.

FAQ sobre demora no Judiciário e o sofrimento de famílias vítimas de chacinas

Quais são os principais impactos enfrentados pelas famílias de vítimas de chacinas?
As famílias enfrentam sofrimento emocional, empobrecimento, adoecimento e a demora nos processos judiciais, que prolongam a dor.

Como a demora no Judiciário agrava a situação das famílias?
A demora nos processos judiciais gera frustração, exaustão e a sensação de desvalorização do sofrimento dessas famílias.

O que as famílias buscam na Justiça?
As famílias buscam a responsabilização do Estado, não apenas dos agentes individuais, mas também da instituição, pelo crime cometido.

Como a estigmatização afeta as famílias das vítimas de chacinas?
Essas famílias enfrentam o estigma por terem um membro morto por policiais, o que cria medo e a sensação de que suas vidas não têm valor.

Qual a resposta do governo paulista sobre as indenizações?
A Secretaria de Segurança Pública de São Paulo informou que o inquérito foi concluído, mas não forneceu detalhes sobre as indenizações das vítimas.

Rogério Victorino

Jornalista especializado em entretenimento. Adora filmes, séries, decora diálogos, faz imitações e curte trilhas sonoras. Se arriscou pelo turismo, estilo de vida e gastronomia.

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