Artigos
Macumba: raízes, preconceito e a proteção legal no Brasil
				A palavra “macumba” carrega uma história rica e multifacetada, profundamente conectada às raízes culturais e espirituais do Brasil. Originada do quimbundo, uma língua banta falada em Angola, inicialmente referia-se a um instrumento musical usado em rituais religiosos. Com o passar do tempo, o termo foi desviado de seu significado original e passou a ser utilizado de forma pejorativa para designar as religiões afro-brasileiras, como o candomblé e a umbanda. Este artigo explora suas origens, os preconceitos associados, o impacto social e as medidas legais que protegem essas tradições.
O que é “macumba” na sua essência?
Na origem, “macumba” designava um instrumento de percussão usado em cerimônias espirituais e sociais. Entre os povos africanos, esses instrumentos desempenhavam um papel fundamental na conexão com o sagrado, na comunicação com ancestrais e na celebração comunitária. Após a diáspora forçada causada pela escravidão, muitos elementos dessas práticas foram recriados e ressignificados no Brasil.
No entanto, o termo foi descontextualizado e passou a ser associado, de maneira preconceituosa, a práticas “mágicas” ou “feiticeiras”. Essa visão distorcida não reflete a riqueza das tradições de matriz africana, que incluem filosofias profundas, valores éticos e práticas terapêuticas.
Sincretismo religioso: uma herança de resistência
A escravidão trouxe milhões de africanos ao Brasil, forçando-os a abandonar seus costumes e religiões. No entanto, em um ato de resistência cultural, eles adaptaram suas crenças ao contexto brasileiro. Surgiu, assim, o sincretismo religioso, que mesclava elementos do catolicismo com práticas africanas.
Essa fusão cultural deu origem a rituais únicos, como oferendas a entidades espirituais, cânticos em línguas africanas e danças ritualísticas. Esses rituais se tornaram ferramentas de preservação identitária e resistência à opressão.
O uso pejorativo da palavra e suas consequências sociais
O termo “macumba” passou a ser usado de forma generalizada e negativa para descrever religiões de matriz africana. Essa apropriação desrespeitosa reforça preconceitos e contribui para a invisibilização dessas tradições.
Os impactos vão além do discurso: comunidades religiosas afro-brasileiras enfrentam discriminação, ataques a seus terreiros e exclusão social. A perpetuação desse estigma alimenta a intolerância religiosa e impede um diálogo respeitoso sobre a diversidade cultural brasileira.
A legislação brasileira e a proteção contra a intolerância religiosa
A legislação brasileira reconhece a liberdade religiosa como um direito fundamental. A Lei nº 7.716/1989 criminaliza a discriminação religiosa, enquanto a Lei nº 14.532/2023 equipara a injúria racial ao crime de racismo, incluindo o racismo religioso como agravante.
Essas leis são reforçadas pela Constituição Federal de 1988, que garante a liberdade de culto e proíbe práticas discriminatórias. Além disso, iniciativas como a criação de delegacias especializadas em crimes de intolerância religiosa têm fortalecido a proteção dos direitos das comunidades religiosas.
Raízes históricas do preconceito
O preconceito contra religiões de matriz africana remonta ao período colonial, quando práticas espirituais dos africanos foram demonizadas pelos colonizadores europeus. Esse processo de desumanização tinha como objetivo justificar a escravidão e destruir as identidades culturais dos povos africanos.
Mesmo após a abolição da escravidão em 1888, os estigmas persistiram, sendo reforçados por discursos racistas e por representações distorcidas na mídia. Esse legado histórico explica por que religiões afro-brasileiras ainda enfrentam desafios significativos para serem respeitadas.
Educação e diálogo: caminhos para a mudança
A superação do preconceito exige um esforço coletivo para promover o respeito e a compreensão. Algumas ações são essenciais:
- Educação nas escolas: Incluir a história das religiões de matriz africana nos currículos escolares é fundamental para combater estereótipos e promover o respeito.
 - Combate às fake news: Informações falsas sobre essas religiões alimentam o preconceito. É crucial disseminar conteúdos confiáveis e bem fundamentados.
 - Diálogo inter-religioso: Promover encontros entre diferentes tradições religiosas pode ampliar a compreensão mútua e reduzir tensões.
 - Denúncia de intolerância: Incentivar a denúncia de casos de intolerância religiosa ajuda a responsabilizar agressores e a fortalecer a aplicação das leis.
 
Impacto cultural e contribuições das religiões afro-brasileiras
As religiões afro-brasileiras desempenham um papel central na formação da identidade cultural do Brasil. Elas influenciam a música, a dança, a culinária e a literatura do país. Expressões como o samba e o maracatu têm raízes profundas nessas tradições.
Além disso, essas religiões promovem valores como a solidariedade, o respeito à natureza e a valorização das ancestralidades, oferecendo uma visão de mundo rica e inspiradora.
Como denunciar intolerância religiosa
Se você for vítima de intolerância religiosa, é importante agir. Entre em contato com a Polícia Militar pelo 190 ou vá até a delegacia mais próxima para registrar a ocorrência. Além disso, procure organizações especializadas em direitos humanos para receber apoio.
Valorizar as religiões afro-brasileiras é reconhecer uma parte essencial da história e da identidade do Brasil. Ao combater o preconceito, promovemos uma sociedade mais justa e inclusiva, onde a liberdade religiosa é respeitada e celebrada.
Ton Rodrigues
Estudante de jornalismo, pai de 3 crianças e pintor amador nas horas vagas. Leitor voraz e apaixonado pela música, mas nunca correspondido. Nascido em terreiro de Umbanda, estudioso do Candomblé.
VER PERFILISENÇÃO DE RESPONSABILIDADE
Antes de continuar, esteja ciente de que o conteúdo discutido entre você e o profissional é estritamente confidencial. A Era Sideral não assume qualquer responsabilidade pela confidencialidade, segurança ou proteção do conteúdo discutido entre as partes. Ao clicar em CONTINUAR, você reconhece que tal interação é feita por sua própria conta e risco.
Aviso de conteúdo
É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita. O site não se responsabiliza pelas opiniões dos autores deste coletivo.
Veja Também
Templo de Umbanda é reconhecido como patrimônio histórico de São Paulo
O Templo Espiritualista de Umbanda São Benedito torna-se o primeiro terreiro de umbanda tombado como patrimônio histórico de São Paulo.
Religiões no Brasil: Censo 2022 do IBGE aponta crescimento inédito da população evangélica no país
O Censo 2022 revela que evangélicos representam 26,9% da população brasileira, indicando mudanças no cenário religioso do país.
Afrofuturismo: reimaginando o futuro com raízes ancestrais
O Afrofuturismo reconecta futuro e ancestralidade negra. Ciência, arte e espiritualidade como ferramentas para curar, resistir e reimaginar o amanhã.
Por que se oferece café ao Preto Velho? Um gesto simples, mas cheio de sabedoria ancestral
Entenda por que se oferece café ao Preto Velho na Umbanda. Simbolismo, história e espiritualidade de um gesto ancestral de...


