Nossa Senhora Aparecida: A Rainha do Brasil e a devoção imperial

Conheça a devoção a Nossa Senhora Aparecida, sua história no Brasil e o papel da Princesa Isabel na consagração da padroeira do país.
Nossa Senhora Aparecida: A Rainha do Brasil e a devoção imperial
Foto: Era Sideral / Direitos Reservados

Desde as origens da história colonial, o Brasil nasceu sob o signo do Catolicismo. As naus portuguesas que trouxeram colonizadores ao Novo Mundo navegavam sob o estandarte da Santa Cruz, reafirmando o vínculo inquebrantável entre a coroa lusitana e a fé cristã.

Mais que uma simples expansão territorial, a missão portuguesa tinha um caráter apostólico que visava não só ao domínio das terras, mas à condução de suas almas à fé Católica. Nesse contexto, a devoção à Virgem Maria, em particular, sob a invocação de Nossa Senhora da Conceição, desempenhou um papel vital na espiritualidade tanto dos colonizadores quanto dos colonizados.

Foi em Portugal que a veneração à Mãe de Deus atingiu seu apogeu, quando da consagração do reino à Nossa Senhora da Conceição em 1640 por Dom João IV.

A devoção mariana portuguesa avançou sob a égide de uma nação que se via como “Terra de Santa Maria”. Esse fervor religioso não tardou a ser transplantado para as terras brasileiras, onde, ao longo dos séculos, assumiria formas singulares, entre as quais a devoção a Nossa Senhora Aparecida se destaca como a mais significativa.

A história de Nossa Senhora Aparecida, sua expressividade e importância, transcende a mera religiosidade popular. É uma história enredada aos grandes acontecimentos políticos e sociais da formação do Brasil, sobretudo, no período imperial, quando a devoção da família real e, em especial, da Princesa Isabel, consolidou o papel da Virgem Aparecida como a Rainha do Brasil.

Este modesto ensaio visa a explorar essa ligação entre a fé e a política, destacando o papel fundamental da Princesa Isabel na consagração da Virgem Aparecida como a Rainha do Brasil, de sua luta pela abolição da escravatura, além de examinar o impacto dessa devoção no imaginário nacional.

O Nascimento de uma devoção: De Nossa Senhora da Conceição à Virgem Aparecida

A devoção a Nossa Senhora da Conceição em Portugal tem origens longínquas, sendo associada aos eventos fundadores da nação. Em 1640, ao reconquistar a independência do reino após o período da União Ibérica, Dom João IV consagrou Portugal e todos os seus domínios a Nossa Senhora da Conceição, reafirmando sua fé no poder intercessor da Virgem Maria. Esse ato foi um reflexo da já antiga veneração que os portugueses nutriam pela Imaculada Conceição, muito antes de a Igreja Católica proclamar oficialmente o dogma em 1854. A partir desse momento, Nossa Senhora da Conceição tornou-se a padroeira oficial não apenas de Portugal, mas de todas as suas colônias, incluindo o Brasil.

Esse fervor mariano atravessou o Atlântico com os colonizadores e desembarcou nas terras brasileiras, onde, posteriormente, a fé católica se misturou com as culturas indígena e africana. A imagem de Nossa Senhora da Conceição era presença constante nos oratórios das casas coloniais, onde, a devoção a Maria Santíssima  ocupava um lugar essencial na religiosidade do povo. Foi nesse solo fértil que, em 1717, emergiu, do fundo de um rio, a figura de Nossa Senhora Aparecida, a padroeira que viria a unir o Brasil sob sua proteção.

Das mãos de pescadores (como os primeiros apóstolos)

Encontrada por três pescadores nas águas do rio Paraíba do Sul, a imagem da Virgem, partida em duas partes e de cor escura, logo foi associada a uma série de milagres.

Desde o primeiro milagre, a pesca abundante que esses pescadores realizaram logo após encontrarem a imagem, a devoção a Nossa Senhora Aparecida não parou de crescer, inicialmente restrita à região de Guaratinguetá e, posteriormente, se expandindo por todo o império.

A Virgem Negra, como passou a ser chamada, tornou-se a retratação da fé e da esperança dos mais humildes, principalmente dos escravizados, que viam em sua cor uma identificação direta de uma intervenção divina.

De uma santa regional, Nossa Senhora Aparecida passou em pouquíssimo tempo a representação da nação brasileira. Sua imagem, marcada pela simplicidade e pela cor escura, refletia a diversidade racial e cultural do Brasil, tornando-se um símbolo de união entre as várias camadas sociais. Mas, para que essa devoção se consolidasse a ponto de ser proclamada a padroeira do país, foi necessária a intervenção de figuras de grande peso político e espiritual, como a família imperial, cuja devoção à Virgem Aparecida moldou o destino da nação.

A Princesa Isabel e a devoção à Virgem Aparecida

O elo entre a família imperial brasileira e Nossa Senhora Aparecida começou a ser forjado em 1822, quando Dom Pedro I, o futuro imperador, visitou a capela da Virgem Aparecida em Guaratinguetá. Naquela ocasião, Dom Pedro, às vésperas de proclamar a independência do Brasil, confiou o futuro da nova nação à proteção da Virgem. Embora sua promessa de consagrar oficialmente o Brasil a Nossa Senhora tenha permanecido sem cumprimento, a devoção da casa de Bragança à Mãe de Deus nunca arrefeceu; seria sua neta, a Princesa Isabel, a realizar o que seu avô havia deixado inacabado.

Isabel, filha primogênita de Dom Pedro II, herdou de sua família não apenas o trono, mas também, a profunda devoção mariana. Católica fervorosa, a princesa sempre recorreu à intercessão da Virgem Maria nos momentos mais difíceis de sua vida.

Sua ligação com Nossa Senhora Aparecida se consolidou quando, após anos de tentativas frustradas para conceber um herdeiro, ela fez uma peregrinação ao pequeno santuário de Aparecida em busca de um milagre. A princesa, acompanhada de seu marido, o Conde d’Eu, rogou à Virgem que lhe concedesse filhos que pudessem assegurar a continuidade da dinastia imperial.

A resposta divina não tardou a vir. Isabel foi agraciada com quatro filhos, dos quais três sobreviveram até a vida adulta, garantindo assim a sucessão da coroa. Em gratidão, a princesa voltou ao santuário de Aparecida em 1868 para pagar sua promessa. Como sinal de devoção e reconhecimento, ofereceu à Virgem um manto adornado com 21 brilhantes, representando as 21 províncias do Império Brasileiro. Esse ato simbolizava não apenas sua fé pessoal, mas a consagração implícita do Brasil à Mãe de Deus.

A Redentora e a abolição da escravatura

Se a devoção de Isabel à Virgem Aparecida consolidou sua fé pessoal, foi seu papel na abolição da escravidão que marcou sua trajetória política e moral. A Princesa Isabel se tornou uma figura decisiva na luta pela liberdade dos escravizados no Brasil, culminando com a assinatura da Lei Áurea em 1888, que extinguiu de uma vez por todas a perpetuação do regime escravocrata. Isabel não agiu sozinha; ela se inspirou nos valores da fé católica e nos ensinamentos da Igreja para defender a causa abolicionista e viu na figura de Nossa Senhora Aparecida uma intercessora poderosa para seus ideais.

A caminhada rumo à abolição foi lenta e cuidadosa. Em 1871, durante a primeira regência de Isabel, foi sancionada a Lei do Ventre Livre, que garantia liberdade às crianças nascidas de escravas a partir daquela data. A Princesa Isabel, em colaboração com políticos abolicionistas, como José Maria da Silva Paranhos, o Visconde do Rio Branco, sabia que uma medida abrupta de abolição poderia provocar instabilidade social, dado o poder econômico dos grandes proprietários de terra que dependiam do trabalho escravo. Assim, a estratégia foi gradativa, visando à extinção do regime de forma estratégica.

Em 1885, a Lei dos Sexagenários concedia liberdade aos escravizados com mais de 60 anos, representando mais um passo rumo à abolição definitiva. O golpe final viria com a promulgação da Lei Áurea, sancionada por Isabel em 13 de maio de 1888. A princesa, que era vista como “A Redentora” pelos abolicionistas, celebrou esse momento com grande júbilo, mas sabia que suas ações não passariam sem consequências.

A queda da monarquia e a consagração de Nossa Senhora Aparecida

Se a assinatura da Lei Áurea representou a redenção de Isabel aos olhos dos abolicionistas, foi também o estopim para a queda da monarquia. A classe dominante, composta em grande parte por fazendeiros que se ressentiam das perdas econômicas causadas pelo fim da escravidão, uniu-se aos republicanos e positivistas para derrubar o regime imperial. A conspiração culminou no golpe republicano de 15 de novembro de 1889, que resultou no banimento da família imperial e na proclamação da República.

Antes de deixar o país, a Princesa Isabel, ciente de que seu destino político estava selado, fez um último gesto de devoção. Em uma nova peregrinação ao santuário de Aparecida, a princesa depositou uma coroa aos pés da Virgem, entregando o destino do Brasil nas mãos de Nossa Senhora:

“Eu, diante de vós, sou uma princesa da terra e me curvo, pois és a Rainha dos Céus e te dou tão pobre presente que é uma coroa igual à minha e se, eu não me sentar no trono do Brasil, rogo que a Senhora se sente nele por mim e governe perpetuamente o Brasil.”

Com a proclamação da República, a família imperial foi exilada e Isabel passou seus últimos anos na Europa, longe da terra que tanto amava. Mas seu legado permaneceu. Em 1904, o Papa São Pio X coroou oficialmente a imagem de Nossa Senhora Aparecida, utilizando a coroa doada por Isabel, e proclamou a Virgem como Rainha e Padroeira do Brasil. A consagração final do país à Virgem Negra foi o cumprimento tardio da promessa de Dom Pedro I, realizada pela neta que tanto se sacrificara pelo bem de sua nação.

FAQs sobre Nossa Senhora Aparecida e a história religiosa do Brasil

Qual a importância da fé católica na colonização do Brasil?
Desde o início da colonização, o Brasil nasceu sob o signo do catolicismo. A missão portuguesa não visava apenas à expansão territorial, mas também à evangelização, conduzindo as almas dos colonizados à fé católica.

Quem foi Nossa Senhora da Conceição e qual sua ligação com o Brasil?
Nossa Senhora da Conceição foi a padroeira de Portugal e suas colônias, incluindo o Brasil. A devoção a ela foi consolidada em 1640, quando Dom João IV consagrou o reino à Virgem, sendo essa devoção trazida para o Brasil pelos colonizadores.

Como a devoção à Nossa Senhora Aparecida começou no Brasil?
A devoção à Nossa Senhora Aparecida começou em 1717, quando pescadores encontraram sua imagem nas águas do rio Paraíba do Sul. A partir de então, ela passou a ser reverenciada pelos brasileiros, especialmente pelos mais humildes e escravizados.

Por que Nossa Senhora Aparecida é chamada de “Virgem Negra”?
Ela é chamada de “Virgem Negra” devido à cor escura da sua imagem, que passou a representar uma identificação direta com os escravizados e os oprimidos do Brasil.

Qual foi o papel da Princesa Isabel na devoção a Nossa Senhora Aparecida?
A Princesa Isabel, devota fervorosa, creditou à Virgem Aparecida o milagre de ter conseguido filhos, após anos de tentativas frustradas. Ela também doou um manto e, mais tarde, uma coroa à santa, simbolizando a consagração do Brasil à Virgem.

Como Nossa Senhora Aparecida se tornou padroeira do Brasil?
A consagração de Nossa Senhora Aparecida como padroeira do Brasil aconteceu em 1904, quando o Papa São Pio X coroou oficialmente sua imagem com a coroa doada pela Princesa Isabel, proclamando-a Rainha e Padroeira do país.

Mântica Rhom

A sabedoria ancestral e o misticismo da cultura cigana em consultas que promovem o autoconhecimento e orientação espiritual através da cartomancia tradicional, do tarô e do baralho cigano.

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