As raízes do ódio e a não violência na espiritualidade

Violência e espiritualidade: uma reflexão sobre o amor e a não violência.
As raízes do ódio e a não violência na espiritualidade
Foto: Canva

Para meditar a realidade da violência é necessário considerar também o conceito de posse. Não se apega apenas às boas experiências e prazeres, mas inclusive aos eventos que moldaram os mecanismos de defesa e com eles respostas reflexas. Isso não é pouco e se levarmos em conta os diversos valores sociais somados que enaltecem sentimentos de baixa frequência como o orgulho, à questão vai muito além. Num primeiro momento isso pode passar despercebido, afinal quem não perde a calma de vez em quando? Ou ainda, e se houver uma justificativa? O que leva a pergunta: existe justificativa para a violência?

A espiritualidade aponta em outra direção, na subordinação do ódio pelo amor. Certo, formula dada e assunto encerrado? Fácil aplicar? Parafraseando São Gregório e lembrando a Encíclica do Papa Francisco “O que não for assumido não pode ser redimido”. Assumir as sombras é libertar-se do controle do ego e conhecer sua origem através de seus efeitos é um bom começo, da mesma forma que entender de onde vem o sentimento, quando foi despertado esse impulso pela primeira vez e principalmente, o que busca defender? Agressividade pode brotar pelo instinto, mas a sua manutenção requer o silencio da razão e a conivência gerada pela satisfação. A ira abre espaço para vingança e assim se inicia um ciclo de vibração destrutível que transforma entes-irmãos em inimigos existenciais.

Todos desejam se armar esquecendo a máxima ensinada por Yeshua (Jesus): “Aquele que vive pela espada, morre pela espada”. Sinal de desesperança e da entrega aos temores internos, impedindo que a razão atue e levando o espírito ao sofrimento. Muitas vezes, atos excessivos poderiam ser evitados através de um novo olhar, entender que aquilo que se manifesta é apenas um instinto de defesa oriundo de uma sombra, uma dor de um passado distante que não existe mais. Um tempo de aprendizado. Como uma canoa utilizada para atravessar um rio e que na qual se abandona logo após a segurança da margem permitindo o livre caminhar.

Abrir espaço para que a razão amadurecida possa assumir é permitir ao espírito consolar a sombra e a se reconciliar com o passado, com os maus atos praticados e sofridos, libertando o tempo presente do peso carregado e para possibilidade de atitudes que alimentam sensações de alegria e felicidade. Isso pode não evitar a violência exterior, mas vai permitir a escolha de não reação e na tentativa de reconciliação com o próximo, ouvindo e respeitando a outra sombra que fala. Violar é antes de tudo uma agressão pessoal, então quando se recupera uma pessoa da ira, inicia-se a abertura para a empatia e o amor incondicional. Segundo a Grande Alma (Mahatma) Gandhi:

“A não violência e a covardia não combinam. Posso imaginar um homem armado até os dentes que no fundo é um covarde. A posse de armas insinua um elemento de medo, se não mesmo de covardia. Mas a verdadeira não violência é uma impossibilidade sem a posse de um destemor inflexível”.

A espiritualidade aponta para a realidade da satisfação. O amor é a única causa e efeito da felicidade, pois no amor encontramos satisfação. Não, não pense em um amor egoico, esse amor repleto de ciúme e ressentimento, não se trata do amor que se esconde nas sombras, mas um amor que transcende para realidade. Sim, a espiritualidade se materializa na realidade, afinal a plenitude se encontra nos atos e não no tempo. Encontrar seu verdadeiro Eu e possibilitar sua realização no aqui e agora é uma libertação que transmite satisfação, e com ela, o desejo de retransmitir essa sensação. Mesmo o amor oriundo do ego quando recebe um raio de sol, se retira das sobras e o faz querendo participar com os demais. Infelizmente frequências inferiores não conseguem reter essa sensação se desvanecendo em meio à sombra, mas não sem antes revelar o real potencial existencial de todos os seres humanos: a felicidade do amor incondicional.

Sergio Bosco

Bacharel em Teologia pela PUC-SP com Extensão universitária em Doutrina social da Igreja pela Faculdade Dehoniana de Taubaté. Escritor, pesquisador e ensaísta.

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