Artigos
Somente Amigos: Um conto sobre amor e amizade
Quando o Samuel começo a namorar a Marta, eles eram bem jovens. Tinham se conhecido fazia muito pouco tempo, mas a energia entre eles era ótima. Tinha tudo para dar certo, e deu.
No mês que eles fizeram 5 meses de namoro, foi o aniversário da Marta. Ela completaria 22 anos e resolveu fazer uma festa em sua casa. Chamou os amigos, os parentes e, claro, o Samuel.
Ele chegou cedo na festa, ajudou a encher os balões, arrumar a decoração. A Marta estava feliz e o Samuel feliz com a felicidade dela.
Ele já tinha ido em sua casa algumas vezes. Fez uma amizade sincera com os pais dela, acabou caindo nas graças dos dois que viam nele um bom rapaz e que tinha tudo para formarem um belo casal.
No quarto da Marta tinha uma enormidade de fotos espalhadas, algumas nas paredes, outras em retratos na cômoda. Fotos dos pais e dos irmãos, tios, tias e amigos. E foi justamente nos amigos que o Samuel viu um problema. Em algumas fotos aparecia o Fábio, um super amigo dela que aparecia em um monte de fotos.
Na primeira vez que ele viu, ficou incomodado, mas não falou nada. Não ia fazer uma cena logo na primeira vez que foi em seu quarto. Algumas visitas depois, perguntou quando que suas fotos iriam aparecer em tantos quadros. Ela se surpreendeu com a pergunta e disse que com o passar do tempo elas iriam aparecer, afinal, eles nem tinha tantas fotos juntos.
No dia da festa ele foi ao quarto da Marta e viu um porta-retrato novo, com uma foto dele e dela, abraçados em uma praça. Bem ao lado da cama, mas notou que as fotos do Fábio ainda estavam lá. Contrariado, não conseguiu assimilar que a sua foto com ela estava em destaque, só viu o amigo, que ele via como um rival.
As pessoas estavam chegando, traziam presentes para Marta, que recebia todos com muito carinho e apreço. O Samuel estava lá, brincando com todos, sorrindo e festejando com os convidados. O pessoal da família dela o abraçou de forma única, trazendo-o para o seio deles, já membro do clã.
Por volta das duas da tarde o Fábio chegou acompanhado de mais um amigo. O Samuel estava no fundo da casa, ajudando o futuro sogro com as bebidas quando Marta chegou acompanhada do Fábio, que vinha ao seu lado abraçando-a. Ao ver a cena o Samuel fechou a cara. Já fez aquela cara de azedo, que não estava gostando da situação. Era a primeira vez que ele se encontrava ao vivo com o amigo dela e ele vinha como se fosse intimo até demais.
– Mozão, vem conhecer o Fábio – disse Marta, apresentando o amigo – Somos amigos faz uns 15 anos.
A cara de poucos amigos do Samuel refletiu no Fábio. Ao pegar a mão do Samuel ele já fez com pouca vontade, não dirigiu nenhuma palavra e já se virou para dar um abraço no pai da Marta.
Foi pior. O mal jeito ao cumprimentar o Samuel já o deixou puto da vida. Já queria discutir com o cara, chamar para resolver lá fora.
O Antônio, pai da Marta, viu que o Samuel não estava bem. Deu uma escapadinha e foi falar com a esposa.
– Amor, dá um pulo lá no fundo. O Samuel não tá bem. Tá olhando feio pro Fábio. Acho que bateu o ciúme nele.
– Mas pudera. De onde ele tirou isso? – perguntou Sandra.
– E eu que sei? A Marta chegou com o Fábio de braços dados, acho que o Samuel não gostou e azedou.
O pai de Marta sempre teve essa atitude. Tudo que via corria até a esposa, contava para ela o que se passava e esperava que ela resolvesse.
Sandra foi para o fundo do quintal, viu o Samuel com os punhos cerrados, com cara de bravo e olhando feio em direção ao Fábio que conversava com um grupo de pessoas, todos amigos da Marta e ela estava lá.
Ao vê-lo naquela situação Sandra ficou consternada. Sabia do sentimento sincero do Samuel pela filha, e sabia que ela era muito apaixonada por ele. O Fábio era só um amigo, não tinha perigo algum.
– É meu caro – Sandra chegou em Samuel -, não tem motivo você ficar assim nervoso. Eles são só amigos. Você não corre nenhum perigo. Eles se conhecem faz tanto tempo, por qual razão eles ficariam agora, quando ela está com você?
– Não sei. Tanta foto no quarto, chegam abraçados. Pegou na minha mão sem firmeza, já olhando para o lado. Será que não tem nada mesmo?
– Você tá vendo o que você quer ver. Fica em paz, meu querido. Não te reconheço nesse papel de troglodita. Você é tão doce. Tem necessidade disso?
Samuel baixou a cabeça, estava triste consigo mesmo. Ele ficou com ciúme e não souber lidar com a situação.
– Eu não gostei do que você fez hoje. Foi feio. Ele, se você conhecer melhor, pode se tornar um grande amigo seu. Isso eu garanto. Vamos mudar essa cara?
– Desculpa, dona Sandra. Não vai se repetir.
Samuel ficou mal. Ele não era aquele tipo de pessoa. Tinha estragado as coisas.
No fim da festa, pessoal já tinha ido embora e o Samuel estava ajudando Sandra com a louça na cozinha quando Marta veio para junto deles.
Ela olhou bem nos olhos do Samuel e perguntou:
– Pode me dizer o que aconteceu hoje?
– Ciúmes. Foi isso.
– E eu dei motivo alguma vez?
– Não.
– Ah, entendi. Então foi gratuito? Uma amostra grátis?
– Filha, segura. Ele entendeu que errou – interveio Sandra.
– Não estou brigando, mãe. Só quero saber se isso vai durar ou podemos ter um relacionamento saudável, onde a confiança existe dos dois lados.
– Entendi, mor. Fica em paz. Eu vi a minha mancada e não vai rolar de novo.
Eu poderia ficar aqui relatando toda a conversa deles, que eles se acertaram e que o Samuel não teve mais crises de ciúmes. Mas eu vou te contar como essa história termina.
O tempo foi passando, o Fábio foi estudar em outro estado, o que dificultou o contato entre os amigos. Das poucas vezes que ficaram os três no mesmo ambiente Samuel e Fábio foram cordiais, sem muita aproximação. Parecia que tinha uma barreira entre eles. Não era proposital, mas não conseguiram quebrar aquela má impressão do dia da festa.
Quatro anos depois da festa de aniversário, Samuel e Marta se casaram. Fizeram uma linda cerimônia e depois reuniram os amigos em uma grande festa.
Fábio não pode vir para o casamento, como vivia em outro estado não conseguiu se livrar dos compromissos e pediu desculpas para a amiga de infância. Marta, claro, ficou chateada, mas entendeu o amigo.
O casamento foi lindo, a festa memorável e no dia seguinte eles foram para sua lua-de-mel. Fizeram uma viagem ao nordeste, curtir uns dias juntos à beira mar. Os dois primeiros dias foram cansativos, curtiram bastante a companhia um do outro e os atrativos do local. No fim do terceiro dia Samuel estava inquieto e agitado. Até a Marta notou que ele não estava bem.
– Que foi, amor? O que você tem hoje.
– Não sei. Desde que a gente veio para o hotel eu estou me sentindo agitado, estranho. Parece que alguma coisa vai acontecer. Tipo uma crise de ansiedade, sabe?
– Fica em paz, amor. Está tudo bem. Deita que eu vou fazer uma massagem em você.
Depois de pegarem no sono, Samuel acordou assustado. Sentiu um peso ao seu lado da cama, do lado de fora, onde dava para a janela. Parecia que alguém tinha sentado ao seu lado. Ao acordar ficou procurando Marta com o braço e a encontrou dormindo, olhou para o outro lado e não viu nada.
Por mais estranho que pareça ele sentiu algo. Não conseguia entender. A sensação de alguém sentar ao seu lado enquanto dormia não foi nada agradável. Do nada uma brisa passou por suas costas e ele se arrepiou. Ao tentar entender o que estava acontecendo se levantou e correu os olhos pelo quarto afim de identificar de onde veio a brisa. A janela estava fechada. Foi em direção ao interruptor da luz, quando, na sua frente, apareceu Fábio.
Ele estava ali, na frente dele, no quarto olhando para Samuel. O susto que tomou foi enorme. O cara estava no seu quarto de hotel, que fica a milhares de quilômetros de sua casa.
Samuel não entendia como ele poderia estar ali no quarto. Ao tentar alcançar o interruptor Fábio levantou o braço e disse:
– Não precisa ter medo. Nem raiva, como na primeira vez. Eu não vim lhe fazer mal.
Samuel ficou gelado. A voz dele parecia diferente, mais fria, mas não perigosa. Não estava conseguindo entender ainda o que estava acontecendo.
– Cara, não estou entendendo. Como você entrou aqui?
– Samuel, presta atenção, eu não tenho muito tempo, mas eu precisava vir aqui. Precisava falar com você antes de partir.
– Partir pra onde, meu. Era só ter ligado, não precisava invadir nosso quarto. A Marta está nua por de baixo do lençol, cara.
– Samuel, escute, por favor. Eu preciso te dizer que em nenhum momento eu quis seu mal. Nunca vi a Marta como uma possível namorada. Era uma amiga, uma irmã. Eu torci muito para que vocês conseguissem ser felizes e ficarem juntos. O casamento de vocês me alegrou muito.
– Pô, legal. Mas poderia ser em outra hora, né? Invadir o quarto das pessoas não é uma boa atitude, mesmo que você tenha ficado feliz com o nosso casamento. Agora, se me der licença, peço que me deixe passar para acender a luz.
– Eu já vou. Por favor, diga para a Marta que eu sempre vou olhar por ela e que ela sempre vai morar no meu coração, e você, Samuel – ergueu o braço e colocou no ombro de Samuel, que sentiu seu corpo esfriar um pouco – eu só queria ser seu amigo. Só isso. Infelizmente não tivemos mais tempo. Por favor, considere minha amizade daqui para frente. Eu já vou.
– Vai pra onde, Fábio. Me fala.
– Para a morte, Samuel. Eu morri e só vim aqui para dizer para você que poderíamos ter sido grandes amigos.
Sem dizer mais nada, Fábio se virou, caminhou em direção a porta e sumiu no ar. Samuel caiu de joelhos, tremia e chorava. Marta ou ouvir o choro dele acordou e viu o seu marido ajoelhado, com as mãos cobrindo o rosto e tremendo.
– Amor, que foi? O que aconteceu?
– O Fábio, amor. O Fábio.
– Que Fábio, que isso agora?
– Ele morreu amor. Ele morreu.
Marta sabia que Samuel não mentira. Percebeu verdade em suas palavras. Se levantou, pegou o celular e tinha mensagem de sua mãe.
“Filha, o Fábio morreu. Morreu. Ele não conseguiu, filha. Quando ver isso liga pra mãe”.
A mensagem tinha exatos um minuto. Rapidamente procurou o nome da mãe na agenda e ligou.
– Filha, você viu a mensagem?
– Vi, mãe, o que aconteceu? O Samuel tá aqui chorando dizendo que ele morreu?
– Sim, filha, morreu. Em um acidente de carro. Ele estava vindo aqui em casa para deixar o presente de casamento de vocês.
– Não, mãe. Não pode ser. Não pode.
– Sim, filha. A mãe dele me ligou. Acharam o carro dele capotado na estrada. Ele morreu faz uns vinte minutos. A mãe dele me ligou para contar.
– Não, mãe… – Marta começou a chorar e não conseguiu mais falar.
Samuel se levantou, viu a situação da esposa e sentou ao seu lado a abraçando.
– Amor, como você soube?
– Ele veio me visitar, amor.
– Como assim, tá doido?
– Não, amor. Eu acordei no susto, quando vi ele estava em pé no nosso quarto. Fui pedir pra ele ir embora e ele me contou que só queria ser meu amigo.
Ton Rodrigues
Estudante de jornalismo, pai de 3 crianças e pintor amador nas horas vagas. Leitor voraz e apaixonado pela música, mas nunca correspondido. Nascido em terreiro de Umbanda, estudioso do Candomblé.
VER PERFILISENÇÃO DE RESPONSABILIDADE
Antes de continuar, esteja ciente de que o conteúdo discutido entre você e o profissional é estritamente confidencial. A Era Sideral não assume qualquer responsabilidade pela confidencialidade, segurança ou proteção do conteúdo discutido entre as partes. Ao clicar em CONTINUAR, você reconhece que tal interação é feita por sua própria conta e risco.
Aviso de conteúdo
É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita. O site não se responsabiliza pelas opiniões dos autores deste coletivo.
Veja Também
Brasil recebe apoio de mais de 80 países para abandonar combustíveis fósseis na COP30
Brasil reúne apoio de mais de 80 países para construir um calendário global de abandono dos combustíveis fósseis durante a...
Pacto global para proteger manguezais ganha apoio de 46 governos
Quarenta e seis países assinam compromisso para restaurar 15 milhões de hectares de manguezais até 2030, fortalecendo ação climática.
Horóscopo do Dia (20/11/2025): previsões de hoje para todos os signos
Horóscopo do dia (20/11/25): dia de renovação emocional e abertura para diálogo. O momento favorece acordos, reconciliações e equilíbrio.
Economia circular: o fim do lixo e o nascimento de um novo ciclo de consumo
A economia circular propõe repensar o consumo para eliminar o lixo, regenerar recursos e equilibrar progresso e natureza.




3 comentários para “Somente Amigos: Um conto sobre amor e amizade”
Adorei seu texto Ton, é de arrepiar. Bjks