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Proibição de celulares nas escolas e o desenvolvimento da linguagem infantil
Como a ausência das telas em sala pode refletir no uso doméstico e beneficiar a comunicação das crianças
Em um momento em que escolas brasileiras começam a restringir o uso de celulares, é inevitável pensar nas repercussões dessa mudança para além do ambiente escolar. Embora a proibição tenha foco nos adolescentes, seus efeitos reverberam também nas crianças pequenas — especialmente quando o celular é presença constante dentro de casa.
Pois essa medida, que parece isolada, pode abrir caminho para uma nova consciência social sobre o uso de telas e seus impactos no desenvolvimento infantil. Afinal, o que acontece com a linguagem, a atenção e a audição de uma criança que convive, desde cedo, com estímulos digitais intensos?
Silêncio entre pais e filhos: o que se perde com o uso precoce de celulares
Primeiramente, quando uma criança passa tempo demais diante de uma tela, ela perde oportunidades preciosas de escutar e praticar a linguagem em contextos reais. São menos histórias contadas, menos conversas ao redor da mesa, menos trocas espontâneas que constroem vocabulário e compreensão do mundo.
Além disso, muitos dos conteúdos consumidos nos dispositivos não são pensados para a idade da criança. Isso gera uma exposição a vocabulários inadequados, estruturas gramaticais confusas e experiências empobrecidas, que comprometem a formação de frases e o desenvolvimento de habilidades sociais, como a empatia e a escuta.
Quando a tecnologia fere os ouvidos
Outro aspecto preocupante do uso desregulado dos celulares é o impacto na audição infantil. Fones de ouvido com volume alto e uso prolongado podem levar a perdas auditivas sutis — que nem sempre são percebidas de imediato, mas afetam diretamente a forma como a criança escuta, fala e aprende.
Essas perdas comprometem não apenas a percepção de sons importantes para a fala, mas também o rendimento escolar. Afinal, como aprender a ler e escrever se a criança não escuta com clareza o som das letras e palavras?
Concentração em risco: telas e o desenvolvimento da atenção
A alternância constante entre vídeos curtos, jogos e notificações gera um hábito de dispersão. Isso reduz a tolerância ao tédio, dificulta a escuta atenta e prejudica a capacidade de sustentar diálogos, seguir instruções e esperar sua vez — habilidades básicas para qualquer interação social.
Do colégio para casa: o que a escola pode ensinar sobre presença
Se a escola decide restringir o uso de celulares, isso pode sinalizar para as famílias que o tempo de tela precisa ser revisto também dentro de casa. Não basta limitar. É preciso substituir — por conversas, leituras, brincadeiras. É nesse espaço de presença e troca que a linguagem realmente floresce.
Na clínica, observo há anos como os hábitos familiares se refletem no desenvolvimento da comunicação infantil. Crianças que são expostas ao diálogo, à escuta ativa e ao brincar simbólico tendem a ter uma linguagem mais elaborada e relações sociais mais estáveis. O contrário também é verdadeiro.
Pequenas atitudes, grandes resultados
- Estabeleça horários fixos para o uso das telas — e cumpra com a criança.
- Evite celulares em momentos de refeição ou antes de dormir.
- Prefira conteúdos educativos, mas sem abrir mão da supervisão.
- Desligue o som alto e dispense os fones de ouvido sempre que possível.
- Use a língua materna ao interagir — isso fortalece a base da comunicação.
Em suma, a tecnologia não é vilã. Mas, para que ela contribua com o desenvolvimento infantil, precisa ser usada com consciência, critério e afeto. A proibição de celulares nas escolas, portanto, pode ser o primeiro passo de um movimento mais amplo, que nos convida a voltar ao essencial: olhar, escutar e conversar com nossas crianças.
FAQ sobre a proibição de celulares nas escolas e o desenvolvimento da linguagem infantil
Qual a idade ideal para introduzir celulares na vida da criança?
A recomendação é evitar o uso de celulares até os 2 anos e, a partir daí, introduzir com moderação e sempre com supervisão.
Celulares realmente atrasam a fala?
Sim, o uso excessivo pode atrasar a fala por reduzir interações verbais com adultos e outras crianças, fundamentais para o desenvolvimento da linguagem.
O que fazer se a escola do meu filho não proibir celulares?
Mesmo sem proibição institucional, os pais podem estabelecer limites claros e conversar com a escola sobre os impactos das telas.
Vídeos educativos no celular são prejudiciais?
Nem sempre, mas devem ser usados com critério. O ideal é que complementem — e não substituam — interações presenciais e brincadeiras.
Como saber se o uso de celular está afetando a audição do meu filho?
Se houver sinais como dificuldade para escutar instruções, aumentar o volume com frequência ou pedir para repetir palavras, é importante procurar um fonoaudiólogo ou otorrino.
Rita Paula Cardoso
Fonoaudióloga clínica da infância, especializada no desenvolvimento da linguagem. No blog Fala Expressa aborda temas relacionados ao desenvolvimento da fala, linguagem, inclusão e bilinguismo.
Especialidades: Fonoaudiologia
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