O que a fala revela sobre a criança: reflexos fonoaudiológicos e psicanalíticos

A fala vai além das palavras: revela identidade, afetos e história. Entenda como fonoaudiologia e psicanálise se encontram.
O que a fala revela sobre a criança: reflexos fonoaudiológicos e psicanalíticos
Foto: Canva

A fala nunca é apenas fala. Ela carrega marcas invisíveis que revelam como cada criança se inscreve no mundo. Na clínica fonoaudiológica, especialmente quando dialoga com a psicanálise, percebemos que o que se diz é tão importante quanto o que se cala.

A fala como marca do sujeito

Quando uma criança fala, não transmite apenas sons. Ela se coloca como sujeito, inscreve sua identidade e deixa transparecer vínculos e conflitos. As pausas, o ritmo, os lapsos, o silêncio e até a escolha das palavras formam um retrato singular de sua história.

É como se cada expressão fosse um mosaico, onde convivem desejo, experiências afetivas e traços do inconsciente. Essa dimensão subjetiva da fala pede do fonoaudiólogo não só um olhar técnico, mas também uma escuta atenta ao que emerge além do sintoma.

O papel do inconsciente na linguagem

A psicanálise nos lembra que a criança já está mergulhada na linguagem antes mesmo de pronunciar suas primeiras palavras. O modo como é chamada, o tom de voz que a envolve, os diálogos que circulam ao redor: tudo isso participa da construção de sua relação com o mundo.

Assim, o aprendizado da linguagem não se limita ao biológico. Ele atravessa afetos, desejos e barreiras subjetivas. Algumas crianças falam muito, mas não estabelecem trocas reais; outras repetem frases como ecos; algumas silenciam não por dificuldade orgânica, mas porque a palavra, para elas, pesa de um jeito particular.

Escutar além do sintoma

O atraso na fala, a gagueira ou as trocas de sons não são apenas problemas a serem corrigidos. Muitas vezes, eles são pistas de algo que a criança tenta comunicar. Uma fala acelerada pode esconder uma fuga; a repetição, uma fixação; o silêncio, uma proteção diante do mundo.

O fonoaudiólogo, então, precisa sustentar uma escuta ampliada. Seu papel não é apenas ajustar sons, mas criar um espaço onde a criança possa se apropriar da própria voz, sem medo e sem pressa.

A fala como lugar de existência

A linguagem é mais do que um instrumento de comunicação: é um modo de existir. Cada tropeço, cada hesitação, cada palavra omitida ou escolhida carrega significados únicos. Por isso, o trabalho clínico não deve se restringir à técnica. Ele precisa acolher o sujeito e ajudá-lo a encontrar seu lugar no dizer.

Porque falar não é simplesmente pronunciar palavras. É marcar presença no mundo.

FAQ sobre o que a fala revela sobre a criança

O que a fonoaudiologia observa na fala infantil?
Além de aspectos técnicos, a fonoaudiologia observa pausas, ritmo, hesitações e silêncios, pois todos revelam algo sobre a subjetividade da criança.

Por que a psicanálise é importante nesse olhar?
Porque mostra que a criança já está atravessada pela linguagem antes mesmo de falar, e que cada palavra carrega sentidos afetivos e inconscientes.

O silêncio também comunica?
Sim. O silêncio pode indicar proteção, bloqueio emocional ou até uma maneira singular de se posicionar diante do mundo.

Todo atraso na fala é orgânico?
Não. Muitas vezes, o atraso ou a dificuldade está relacionado a aspectos emocionais ou às relações que a criança estabelece com o meio.

Qual é o papel do fonoaudiólogo nesse processo?
Criar um espaço de escuta e acolhimento para que a criança encontre sua própria voz, compreendendo a fala como parte de sua existência.

Rita Paula Cardoso

Fonoaudióloga clínica da infância, especializada no desenvolvimento da linguagem. No blog Fala Expressa aborda temas relacionados ao desenvolvimento da fala, linguagem, inclusão e bilinguismo.

Especialidades: Fonoaudiologia

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